sexta-feira, 21 de março de 2008

Vexila Regis - António Sardinha


Como é Sexta-feira da Paixão, resolvi postar um inspirado poema de António Sardinha que trata deste dia e se encontra na obra ititulada "Na corte da saudade".


Vexila Regis
Por António Sardinha

Alors commence la solenelle procession des siècles chrétiens s'acheminent à la suite de la croix dans la direction de l'avenir.

Godefroid Kurth

O órgão geme. É Sexta-feira Santa
Adoração da Cruz na Catedral.
E sobe o coro numa voz que espanta,
- voz de trágédia e cerração mortal!

Só um madeiro agreste se levanta,
abrindo os braços negros por igual.
Os padres cantam. E em tristeza tanta
recanta o incenso a mística espiral.

Soluça o órgão... Com a cruz erguida,
por todo o templo a fé que nos alenta
entoa um hino à Árvore-da-Vida.

E eu, pobre criatura transitória,
enquanto a procissão perpassa lenta,
julgo assistir ao desfilar da História!

domingo, 16 de março de 2008

Homenagem a Gerardo Mello Mourão - Victor Emanuel Vilela Barbuy

Em março de 2007, logo após o falecimento de Gerardo Mello Mourão, escrevi a breve e singela homenagem-póstuma a este brilhante poeta, romancista e ensaísta cearense, que foi publicada na edição do jornal "Linguagem Viva" daquele mês e que ora transcrevo.



Homenagem a Gerardo Mello Mourão
Por Victor Emanuel Vilela Barbuy




Deixou de bater o coração daquele que foi o último grande bardo vivo do Brasil. Faleceu no dia 09 deste mês, no Rio de Janeiro, aos noventa anos, o magno escritor, poeta, romancista e jornalista Gerardo Mello Mourão.
O Ceará, o Sertão, o Nordeste, o Brasil, a América, o Mundo Lusófono, a Hispanidade e a Latinidade perdem, com a partida de Mello Mourão para a Milícia do Além, um de seus mais brilhantes escritores e pensadores.
Um dos mais respeitados e admirados autores brasileiros no exterior, Gerardo Mello Mourão foi indicado ao Prêmio Nobel em 1979, havendo sido sua inscrição realizada pela New York University, e recebeu elogios de poetas do quilate de um Octavio Paz, de um Pablo Neruda, um Michel Deguy e até mesmo de um Ezra Pound. Este último, considerado por Mello Mourão como o maior poeta dos últimos séculos, assim escreveu: "Toda a minha obra foi uma tentativa de escrever a epopéia da América. Não o consegui. Ela foi escrita no poema espantoso do poeta do País dos Mourões.”
Em nosso País, a despeito do silêncio criminoso de alguns escravos do preconceito ideológico, que jamais o perdoaram por haver militado na Ação Integralista Brasileira, Mello Mourão e sua obra tiveram seu valor reconhecido por críticos do porte de um Wilson Martins, que chamou seu livro “Invenção do Mar” de “Os Brasilíadas”, numa comparação com “Os Lusíadas” de Camões, e por escritores da estirpe de um José Cândido de Carvalho, de um Octavio de Faria e de um Carlos Drummond de Andrade, que declarou-se “possuído de uma violenta admiração pelo imenso, dramático e vigoroso painel” da poesia de Gerardo Mello Mourão.
Foi o mesmo Carlos Drummond de Andrade quem, diante de “O País dos Mourões”, comovidamente exclamou: “Esta poesia foi tudo quanto sempre desejei escrever na vida, e nunca tive força. Gerardo Mello Mourão teve.” E foi, ainda, o mesmo Carlos Drummond de Andrade quem reconheceu: "O grande poeta de Minas Gerais não sou eu: - é o espantoso poeta Dantas Mota.
O grande poeta do Brasil também não sou eu: - é o nordestino Gerardo Mello Mourão. Sempre sonhei chegar à poesia a que ele chegou. Não tive força. Ele teve."
Observou Afonso Botelho que "a poesia da língua portuguesa passou a sustentar-se sobre quatro pilares: Camões, Pessoa, a carta de Caminha e Gerardo".
De toda a obra poética de Gerardo, que foi eleito, em 1997, pela Guilda Órfica, o poeta do século XX, destaco – além do autêntico “Os Brasilíadas” que é “A Invenção do Mar”, livro dedicado a Luiz Gonzaga, o “Homero sertanejo” – a trilogia épica “Os Peãs”, composta por “O País dos Mourões”, “Peripécia de Gerardo” e “Rastro de Apolo”.
Outra das obras-primas do grande escritor cearense é “O Valete de Espadas”, que, considerado o primeiro romance expressionista de nossa Literatura, foi escrito enquanto o autor se encontrava injustamente preso. Por falar em prisões injustas, foi Gerardo preso injustamente por dezoito vezes, durante o Estado Novo de Getúlio Vargas e o Governo Militar, que também cassou seu mandato de Deputado Federal.
“O Valete de Espadas” foi escrito, bem como as dez elegias da obra “Cabo das Tormentas”, na ocasião em que Gerardo, acusado de ser um espião nazista pela ditadura estadonovista de Vargas, permaneceu encarceirado por quase seis anos, até ser libertado em razão de um apelo de intelectuais franceses liderados por Jean Paul Sartre, Simone de Beauvoir e Albert Camus, cuja peça teatral “Calígula” Gerardo traduziu para o nosso idioma.
Cearense quatrocentão e católico apostólico romano tradicionalista, Gerardo Mello Mourão nasceu em Ipueiras, ao pé da Serra da Ibiapaba, a 08 de janeiro de 1917. Menino ainda, deixou o seu ensolarado “país do Grande Ceará” e seguiu para o Sul, onde estudou no célebre Seminário Redentorista de Congonhas do Campo, em Minas Gerais, e no Convento da Glória, em Juiz de Fora.
Mello Mourão já havia desistido da vida monástica, quando, no Rio de Janeiro, encontrou-se com Alceu Amoroso Lima, o Tristão de Athayde, que o aconselhou a entrar para o Integralismo, movimento cívico-político oficialmente criado a 07 de Outubro de 1932, quando o eminente escritor, romancista, jornalista e político Plínio Salgado lera, no Teatro Municipal de São Paulo, o seu chamado Manifesto de Outubro.
Embora tenha sofrido, em razão de sua filiação ao Integralismo, as piores perseguições, Gerardo Mello Mourão declarou: “Não tenho do que me arrepender, participei do mais fascinante grupo da inteligência do País.” Deste grupo que reuniu inúmeras centenas de intelectuais do mais alto valor e projeção, incluindo personagens como Gustavo Barroso, Miguel Reale, Olbiano de Mello, San Tiago Dantas, Madeira de Freitas, Câmara Cascudo, Adonias Filho, Herbert Parentes Fortes, Goffredo e Ignacio da Silva Telles, Ribeiro Couto, Alfredo Buzaid, Rubem Nogueira, Hélio Vianna, Antônio Gallotti, Américo Jacobina Lacombe, Thiers Martins Moreira, Pe. Hélder Câmara, Rui de Arruda Camargo, Ernani Silva Bruno, Raymundo Padilha, Raimundo Barbosa Lima, José Loureiro Júnior, Belisário Penna, Alcibíades Delamare, João Carlos Fairbanks, Guerreiro Ramos, Abdias do Nascimento, José Lins do Rego, Jayme Ferreira da Silva, Tasso da Silveira, Augusto Frederico Schmidt, Vinícius de Moraes, Paulo Fleming, Francisco Karam e Dantas Mota - aquele que Carlos Drummond de Andrade considerava o maior poeta mineiro -, dentre tantos outros não menos importantes.
Neste momento de profundo pesar pelo falecimento de Gerardo Mello Mourão, consolo-me em saber que ele será para sempre lembrado como um dos maiores escritores da Língua Portuguesa e espero que Deus suscite, na atual geração e nas gerações vindouras, homens do valor de Gerardo, para que o Brasil possa ser a Grande Nação com que sonhou aquele nobre bardo da Província de José de Alencar, Antônio Conselheiro, Farias Brito e Gustavo Barroso.

sexta-feira, 14 de março de 2008

Memória - António Sardinha


O poema que lerão a seguir é da autoria do alentejano António Sardinha (Monforte, 09/09/1888 — Elvas, 10/01/1925), que é sem dúvida alguma o maior doutrinador tradicionalista, monárquico, patriótico e nacionalista de Portugal, bem como um dos mais inspirados poetas já nascidos na pátria de Camões. Principal doutrinador do Integralismo Lusitano, Sardinha nos legou ensaios político-filosóficos do valor de "Ao princípio era o Verbo" (1924) e de "A Aliança Peninsular" (1925) e pregou a restituição a Portugal do sentimento de sua grandeza, grandeza esta que se desprende da vocação superior que a esta pátria pertence [e que nós outros, brasileiros, herdámos] dentro do plano providencial do Ser Supremo, como nação ungida para dilatar a Fé e o Império pelos quadrantes do Mundo, bem como a aliança de todos os povos hispânicos, do Brasil às Filipinas, do México a Portugal, da Galiza a Angola, da Biscaia ao Peru, de Navarra a Goa e assim por diante.


MEMÓRIA

Meu coração de lusitano antigo
bateu às portas de Toledo, a estranha.
Mais roto e ensanguentado que um mendigo.
só a saudade as passos lhe acompanha.

Pois a saudade ali me deu abrigo.
ao pé do Tejo que a Toledo banha.
Levava os dias a falar comigo,
como um pastor com outro na montanha.

Em todo o mundo há terra portuguesa,
desde que a alma a tenha na lembrança
e a sirva sempre com fervor igual.

Talvez por isso, em horas de tristeza,
eu pude à sua amada semelhança
criar pra mim um novo Portugal!

terça-feira, 22 de janeiro de 2008

Cento e treze anos de Plínio Salgado - Victor Emanuel Vilela Barbuy





Há cento e treze anos, no dia 22 de janeiro de 1895, nasceu, na bucólica, pacata, acolhedora e tradicional cidadezinha serrana de São Bento do Sapucaí, na divisa entre São Paulo e Minas Gerais, um dos maiores e mais injustiçados homens de pensamento e ação deste País: Plínio Salgado.
Pensador, escritor, romancista, poeta, jornalista, filósofo, ensaísta, historiador, sociólogo, político e orador dos mais amplos recursos, Plínio Salgado foi, sem sombra de dúvida, o maior doutrinador cristão, patriótico e nacionalista do Brasil, nos legando atualíssimas lições de Cristianismo, de tradicionalismo, civismo, democracia e dos mais sadios, justos, equilibrados e construtivos patriotismo e nacionalismo.
Maior pensador tradicionalista do Brasil ao lado de José Pedro Galvão de Sousa, na opinião do brilhante jusfilósofo espanhol Francisco Elías de Tejada y Spínola, Plínio nos legou obras religiosas da envergadura de “Primeiro, Cristo!”, “A Aliança do sim e do não” e de “Vida de Jesus”, que é “a jóia de uma literatura”, no dizer do Pe. Leonel Franca, havendo sido traduzida para diferentes idiomas e recebido os mais merecidos elogios da parte de diversos dos mais ínclitos escritores, críticos literários, religiosos e pensadores católicos d’aquém e d’além mar.
Os romances sociais em prosa modernista da lavra de Plínio Salgado, em especial o primeiro deles, “O estrangeiro”, receberam os maiores e mais justos elogios, ao longo das décadas, da parte de dezenas dos mais abalizados escritores e críticos literários do País e do exterior, de Monteiro Lobato a Wilson Martins, de Menotti Del Picchia a Tristão de Athayde, de Cassiano Ricardo a Jackson de Figueiredo, de Tasso da Silveira a Agripino Grieco, de Afrânio Peixoto a Amândio César, de Augusto Frederico Schmidt a Brito Broca, de Cândido Mota Filho a Augusta Garcia Rocha Dorea, de José Américo de Almeida a Fernando Whitaker da Cunha...
Outro romance de sua autoria é “A voz do Oeste”, poema em prosa ambientado no tempo dos bandeirantes e que configurou-se, segundo Juscelino Kubitschek, no “grito” que preparou a edificação de Brasília.
Se o tempo não me fosse tão escasso, trataria das grandes obras políticas e filosóficas de Plínio Salgado, que contêm páginas de impressionante atualidade, conforme observado por Miguel Reale, Gerardo Mello Mourão e tantos outros tão ilustres quanto estes ou um pouco menos.
Não cabe tratar aqui a respeito do Integralismo, o tão denegrido movimento cívico-político fundado por Plínio Salgado e que se configurou no primeiro “movimento de massas” da História do Brasil e no “mais fascinante grupo da inteligência do País”, no dizer de Gerardo Mello Mourão, reunindo dezenas e dezenas de intelectuais da mais alta envergadura, de Miguel Reale a Câmara Cascudo, de Gustavo Barroso a Goffredo Telles Junior e seu irmão, Ignacio da Silva Telles, de Alfredo Buzaid a San Tiago Dantas, de Adonias Filho a Hélder Câmara, de Tasso da Silveira a Gerardo Mello Mourão, de Augusto Frederico Schmidt a Guerreiro Ramos, de Dantas Mota a Rosalina Coelho Lisboa...
Sei – como sabia o Prof. Miguel Reale, ao escrever seu artigo intitulado “O centenário de Plínio Salgado” e publicado em “O Estado de S. Paulo” a 25 de fevereiro de 1995 – que meu pronunciamento não será capaz de fazer justiça ao grande brasileiro e paulista que foi Plínio Salgado, posto que só o tempo o fará. Mas também sei – como o saudoso autor de “O Estado Moderno” e de “Horizontes do Direito e da História” – que Plínio Salgado, assim como o Tenente Siqueira Campos, de quem era sincero admirador, sempre considerou que da Pátria nada se deve esperar, nem mesmo compreensão. E me resta o consolo de que o nome de Plínio Salgado, como afirmou Juscelino Kubitschek, perpetuar-se-á, “como um símbolo iluminando o futuro”.

sexta-feira, 4 de janeiro de 2008

Poeta - Teixeira de Pascoaes



Segue um belo poema de Teixeira de Pascoaes (pseudónimo de Joaquim Pereira Teixeira de Vasconcelos ) , um dos mais destacados representantes do saudosismo e um dos líderes da "Renascença Portuguesa", dirigindo, inclusive, a seção literária do principal órgão deste movimento, a revista "Águia".


Poeta

Quando a primeira lágrima aflorou

Nos meus olhos, divina claridade

A minha pátria aldeia alumiou

Duma luz triste, que era já saudade.

Humildes, pobres cousas, como eu sou

Dor acesa na vossa escuridade...

Sou, em futuro, o tempo que passou-

Em num, o antigo tempo é nova idade.

Sou fraga da montanha, névoa astral,

Quimérica figura matinal,

Imagem de alma em terra modelada.

Sou o homem de si mesmo fugitivo;

Fantasma a delirar, mistério vivo,

A loucura de Deus, o sonho e o nada.